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Educação Inclusiva

 

Educação inclusiva: Dos caminhos percorridos à inclusão efetiva

  A construção de uma escola que atenda às necessidades de todos e de cada um dos alunos, garantindo oportunidades de aprendizagem para todos, é atualmente um dos maiores desafios com que as escolas e os profissionais da educação se confrontam. A entrada em  vigor do Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho  criou  a oportunidade de operacionalizar um conjunto de princípios e práticas conducentes a uma inclusão efetiva de todos e de cada um dos alunos. À concretização do estabelecido no referido decreto não são alheias as condições que são necessárias criar ou consolidar nas escolas para garantir e facilitar a implementação do modelo subjacente. A especificidade característica de cada contexto educativo justifica as opções diferenciadas na implementação do novo regime jurídico de educação inclusiva. Apresenta-se aqui a experiência de implementação no Agrupamento de Escolas Professor Abel Salazar (AEPAS), no concelho de Guimarães, refletindo sobre as condições de partida do agrupamento, a implementação propriamente dita e os desafios e próximos passos necessários para a concretização de uma inclusão plena e efetiva.

 

 Assumindo  no seu  projeto  educativo a  missão  de  prestar um  serviço educativo  de qualidade, pautado por princípios de inclusão, exigência, responsabilidade e compromisso partilhados entre todos os intervenientes educativos, o AEPAS tem privilegiado uma organização e funcionamento potenciadoras de uma ação pedagógica inclusiva e favorecedoras da implementação do novo regime jurídico da educação inclusiva.

 Assente numa visão comum de escola ancorada na ambição estratégica de “edificar uma escola  de  excelência  e  de  sucesso  educativo  –  com  todos  e  para  todos!”  (cf.  projeto educativo), o agrupamento reconhece a ação colaborativa, integrada e articulada entre todos para a valorização de todos e de cada um dos alunos. A concretização desta visão resulta de um trabalho contínuo e sistemático, destacando-se alguns aspetos basilares, que se  constituem  como  condições  essenciais  para  a  implementação  da  legislação.  Neste âmbito, sublinha-se a existência no agrupamento de um corpo docente e não docente estável e empenhado, com um conhecimento aprofundado do contexto e da comunidade educativa e comprometido com uma visão comum de escola. Todos assumem a responsabilidade partilhada de promover a participação e as aprendizagens efetivas de todos os alunos e têm a possibilidade de participar nas decisões e nas ações da escola. São também criadas condições organizacionais propícias ao envolvimento e trabalho colaborativo  (formal  e  informal)  das  diferentes  equipas  educativas,  cujas responsabilidades se encontram bem definidas e orientadas para o sucesso dos alunos. Reconhecendo a heterogeneidade de alunos que frequentam o agrupamento e as  suas necessidades diferenciadas, são disponibilizadas modalidades diversas de suporte nos domínios da aprendizagem e do comportamento. São estabelecidas metas de trabalho e indicadores e definidos mecanismos sistemáticos de avaliação dos resultados dos alunos bem  como  das  diferentes  medidas  de  suporte  à  aprendizagem  e  comportamento,  no sentido de reorientar e melhorar as práticas desenvolvidas. Destaca-se, ainda, uma liderança mobilizadora e orientada pelos princípios da inclusão, aberta à inovação e melhoria de escola, estimuladora do trabalho colaborativo e do desenvolvimento profissional dos diferentes intervenientes educativos, aspetos que se revelam essenciais e suportam a implementação de práticas mais inclusivas.

 Estas condições sustentaram as ações e práticas que decorreram da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 54/2018. Neste sentido, o processo de implementação da legislação no agrupamento iniciou-se pela criação de uma equipa multidisciplinar, constituída de acordo com a lei, com a preocupação de garantir representatividade de todos os ciclos de ensino do agrupamento. Para além da constituição da equipa e do respetivo coordenador, considerou-se pertinente a definição clara das atribuições da equipa, bem como da sua organização e funcionamento, garantindo momentos para reuniões regulares da equipa permanente e alargada. Esta equipa assumiu-se no agrupamento como mobilizadora da implementação do modelo e conta com o apoio dos órgãos de gestão, articulando com outras equipas educativas, das quais se destacam os conselhos de turma/conselhos de ano e a equipa de avaliação interna.

 Ainda que seja um trabalho em curso, a equipa multidisciplinar, com o propósito de tomar decisões consistentes e alinhadas com os referenciais teóricos, procurou identificar e definir de forma clara as medidas educativas de cada um dos níveis de suporte. Para além dos aspetos relativos à transição para o novo modelo, nomeadamente no que diz respeito à elaboração dos relatórios técnico-pedagógicos e programas educativos individuais dos alunos, foi dado particular enfoque à mobilização atempada, no início do ano letivo, das medidas de suporte necessárias à aprendizagem, agilizando o processo de identificação das necessidades dos alunos, partindo do conhecimento já adquirido pelos diferentes intervenientes educativos. Foram igualmente estabelecidos objetivos claros e indicadores de resultados relativos às medidas de suporte mobilizadas, considerando a necessidade de intencionalização e monitorização da eficácia das práticas implementadas.

 Reconhecendo o desafio e a complexidade de implementação do atual modelo, considera-se que este processo está ainda a dar os primeiros passos e que é necessário um forte investimento e compromisso do agrupamento e dos seus profissionais para edificar e consolidar uma cultura e práticas inclusivas. Neste sentido, consideram-se como desafios futuros para o agrupamento: (i) alargar o espetro de atuação da equipa multidisciplinar, tornando a sua ação mais abrangente e integrada para além do foco nos alunos identificados, de modo a contribuir para a melhoria da ação pedagógica; (ii) investir no desenvolvimento profissional dos intervenientes educativos ao nível de práticas com evidência empírica; (iii) constituir bancos de materiais de apoio à avaliação e intervenção, suportados teórica e empiricamente; (iv) reforçar as práticas de avaliação e monitorização que sustentam as decisões tomadas em relação às medidas ajustadas aos alunos e à organização e funcionamento da escola, garantindo a eficácia das medidas adotadas; (v) consolidar uma linguagem alinhada com os princípios da inclusão e que reflita um abandono em absoluto dos sistemas categoriais; (vi) consolidar um envolvimento ativo e efetivo dos encarregados de educação; (v) reforçar mecanismos de identificação e intervenção atempadas dos alunos ao nível da aprendizagem e do comportamento.

 Entende-se que os desafios que se avizinham são complexos, mas potenciadores de mudanças organizacionais e pedagógicas, que se pretendem que sejam sustentáveis ao longo do tempo. Reconhece-se, contudo, que a inclusão é um processo em construção e que é necessário tempo e investimento para que seja uma rotina bem estabelecida  na escola.

 Helena Azevedo

 Psicóloga do AE Abel Salazar, Guimarães